Introdução:
Pedro é liberto da prisão de maneira fantástica.
Um anjo o acordou e o conduziu para fora da prisão.
Diz o texto que depois passarem a primeira e a segunda sentinela,
chegaram ao portão de ferro que dava para a cidade.
O portão se abriu automaticamente; e, saindo, enveredaram por uma rua, e
logo adiante o anjo se apartou dele.
O anjo, até aquela altura, estava fazendo tudo; mas, agora, de
repente, ele deixa Pedro por conta própria.
O apóstolo fica parado ali na rua.
Desenvolvimento:
Duas coisas são mencionadas a respeito de Pedro, uma no versículo 11 e a
outra no versículo 12.
A primeira é: “Então, Pedro, caindo em si”, e a segunda,
no versículo 12: “E, considerando ele nisso”.
Pedro caiu em si e considerou algo. Não me preocupo com o que ele
considerou.
Pedro saiu “não sabendo que era real o que se fazia por meio do
anjo; parecia-lhe, antes, uma visão”.
Aqui temos dois aspectos da vida cristã.
Qual é o lugar do miraculoso e do sobrenatural na vida cristã?
Pedro seguindo mecanicamente o anjo, e, no momento seguinte, após o anjo
apartar-se dele, Pedro pensando.
Na história da igreja as pessoas sempre têm ido de um extremo a outro.
Alguns enfatizam apenas o sobrenatural, como se não existisse outro
aspecto da vida cristã.
Já outras pessoas excluem totalmente o sobrenatural, e consideram a vida
cristã em uma característica racional.
Algumas pessoas tentam jogar uma coisa contra a outra, de exaltar uma em
detrimento da outra.
Por que precisamos dizer que tudo é miraculoso ou nada é miraculoso?
Não é preciso ressaltar uma coisa excluindo a outra. Ambas as coisas são
válidas.
Por que isso é importante? Por que é tão importante considerarmos esse
assunto?
1. Porque somos seres racionais
Como seres que pensam, não temos o direito de deixar certos aspectos da
vida cristã no escuro.
É nosso dever pensar, argumentar e compreender o tanto quanto possível.
Cada um de nós deve procurar luz e conhecimento.
De forma alguma o evangelho premia a ignorância e o obscurantismo.
Com certeza não tem havido nada na história do mundo que tenha estimulado
tanto os homens a raciocinar e pensar como o evangelho.
É nosso dever examinar as Escrituras e compreendê-las o melhor que
pudermos.
Não é razoável as pessoas se fecharem em determinado círculo,
recusando-se a considerar questões difíceis.
É nosso dever encarar a verdade e explicar os fatos da melhor maneira que
pudermos.
2. Não podemos levar a fé ao descredito
Não há nada que tenha levado tanta gente a indispor-se contra a fé do que
as reivindicações extravagantes que têm sido feitas em nome do evangelho.
As pessoas têm alegado intervenções miraculosas quando é patente que o
ocorrido é algo que pode ser facilmente explicado.
E, devido às falsas alegações, há muitas pessoas inteligentes que se
voltam contra a igreja e tudo que se refere à religião.
Pelos interesses da verdade e da igreja e de seu Senhor, nossa obrigação
é compreender a situação o máximo que pudermos.
Para não trazermos desgraça sobre a instituição a que pertencemos.
3. Combater as falsas expectativas
Algumas pessoas, de repente, se encontram em uma situação que parece que
os milagres não acontecem.
Essas pessoas acham que Deus as deixou, e muitas delas acham que pecaram
contra o Espírito Santo.
Isso acontece por falsas expectativas criadas.
Acharam que ao entrar na igreja tudo iria mudar de uma forma
sobrenatural.
Ficam profundamente deprimidas e algumas vezes até entram num estado de
transtorno mental e desequilíbrio.
A maneira de evitar isso é tentar compreender o ensino do Novo Testamento
com respeito à interrelação do sobrenatural e do natural.
4. Discernimento das situações
Sempre saberemos o que esperar e o que devemos fazer toda vez que nos
encontrarmos no tipo de situação que é descrita nesse capítulo.
Nós não sabemos o que o futuro nos reserva.
Talvez haja um tempo terrível de perseguição lá adiante.
O que devemos esperar, o que devemos fazer, se nos encontrarmos nas
circunstâncias em que Pedro se encontrava?
É somente se tivermos aprendido a compreender entre esses dois elementos,
que estaremos precavidos para qualquer emergência que possa surgir.
Essas são algumas razões que fazem disso tudo nosso dever sagrado para
encararmos essa questão.
Qual é o ensino desse episódio?
Precisamos reconhecer o fato miraculoso na vida cristã.
O elemento miraculoso constantemente entra na situação.
Os primeiros dias da igreja cristã foram grandemente marcados por essa
evidência de milagres e poder sobrenatural.
Deus operou milagres especiais pelas mãos de Paulo e Pedro, e isso levou
a um grande crescimento da igreja.
Com certeza, o fato dos milagres encontra-se além de qualquer
controvérsia.
Ser um cristão não é apenas ser bom, decente e virtuoso.
Ser cristão implica na intervenção de Deus na vida da pessoa.
O miraculoso acontece unicamente no tempo de Deus.
Isso fica bem claro em nossa história aqui.
O anjo veio a Pedro quando este estava adormecido.
Deus sempre toma a iniciativa nesses milagres e nesse assunto.
Você jamais encontra os apóstolos anunciando que vão operar um milagre no
dia seguinte ou em qualquer outro dia.
Algumas pessoas hoje afixam cartazes anunciando que haverá milagres e
convidam as pessoas a virem à reunião.
Não há nada parecido com isso no Novo Testamento.
Deus faz o que as pessoas não conseguem
O elemento miraculoso entra quando o homem se depara com algo que não
consegue fazer.
Pedro ali na prisão está completamente desamparado.
Deus opera de maneira miraculosa e quando o homem se depara com uma
situação em que ele não consegue fazer nada.
Esse é o princípio igualmente aplicável em todos os outros casos e
exemplos encontrados em toda a história da igreja.
Os milagres cessam no ponto em que a capacidade humana é suficiente.
O homem, então, é deixado para encarar sozinho a situação.
“Então, Pedro, caindo em si” — ou seja, depois que o anjo se apartara dele.
Pedro havia chegado ao ponto em que podia usar sua própria mente.
Ele é deixado considerando por si a que casa seria melhor dirigir-se.
O anjo não o conduz para a casa da mãe de João Marcos. Pedro faz isso
tudo por conta própria.
O miraculoso cessa exatamente naquele ponto em que a capacidade do homem
é suficiente, e ali ele o deixa por conta própria.
A lição deve ser evidente e clara, que não devemos esperar em nossa
experiência cristã uma constante manifestação do sobrenatural.
A vida cristã não deve ser representada como uma contínua manifestação de
milagres.
Conclusão:
Por que existe o elemento miraculoso e o comum?
Sob o miraculoso, o homem se encontra num estado mais ou menos passivo.
Ele pensou que estivesse tendo uma visão.
Esse é um estado mecânico em que o homem não sabe ao certo o que está
acontecendo.
Ele faz o que faz sem saber como ou por quê. A ação é automática.
Isso é plenamente verdade na experiência de conversão.
Em certo sentido, o homem está ciente de algo acontecendo e mesmo assim
ele não sabe o que está ocorrendo.
É somente quando passa a pensar a respeito disso mais tarde e lê a Bíblia
que ele começa a entender o significado de tudo que aconteceu.
É à medida que crescemos na graça e no conhecimento que começamos a
apreciar algo do coração eterno.
Deus não quer que nos comportemos como máquinas.
Ele nos fez e nos concedeu uma mente, um cérebro, o poder de raciocinar e
pensar.
Ele ordenou as coisas de tal forma, que há coisas que somente ele
consegue fazer, e, após fazê-las, ele nos deixa por conta própria para
pensarmos e raciocinarmos.
É uma tragédia que tanta gente gaste sua vida cristã sentada, como numa
cadeira de balanço, esperando que os céus se abram.
Quando consideramos a situação como Pedro o fez, ficaria bem óbvio que há
muitas coisas que elas podem fazer por si mesmas.
Deus concede-nos a graça e a sabedoria para fazermos aquilo que temos
competência para fazer.
Imagine por um momento que Pedro, após o anjo deixá-lo sozinho, ficasse
esperando onde estava, acreditando que o anjo voltaria para dizer-lhe para onde
se dirigir.
Não é preciso muita imaginação para ver o resultado.
O alarme seria dado na prisão, os soldados procurariam pelas ruas, e
Pedro bem logo estaria de volta por trás dos portões de ferro.
E é exatamente o que vai acontecer a esse tipo de homem.
Quando Deus tiver feito o impossível para você, ele espera que você pense
e raciocine por si e corra para um lugar seguro.
Essa é a única maneira de evitar a apostasia, o retrocesso; de evitar
esses lamentáveis altos e baixos na vida cristã.
Isso é para reconhecer que o miraculoso avança até certo ponto, e então
nos deixa como seres capacitados por Deus.
Adaptado do livro: Lloyd-Jones, Martin. O Cristão em uma era de
terror: sermões inéditos, pregados no contexto da Segunda Guerra Mundial até a
Guerra Fria (Portuguese Edition) (p. 65). Edição do Kindle.
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