Lucas 13:34
“Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os
que te foram enviados! Quantas vezes quis eu reunir teus filhos como a galinha
ajunta os do seu próprio ninho debaixo das asas, e vós não o quisestes”!
Introdução:
Não restam dúvidas
de que se trata de um texto complexo. A leitura simples e literal do texto nos
leva a perceber o lamento de Jesus por não conseguir juntar os filhos de
Jerusalém. Porém, devemos partir do princípio que em nenhum momento a Bíblia
pode se contradizer. Por isso, devemos analisar todo contexto com os
ensinamentos bíblicos sobre o mesmo tema.
Jesus recorda a
culpa de sangue que reis e habitantes de Jerusalém assumiram. Zacarias,
apedrejado no pátio do templo, já fora mencionado por Jesus (2 Cr 24:20–22; Lc
11:51).
2 Cr 24:20–22 “O
Espírito de Deus se apoderou de Zacarias, filho do sacerdote Joiada, o qual se
pôs em pé diante do povo e lhes disse: Assim diz Deus: Por que transgredis os
mandamentos do Senhor, de modo que não prosperais? Porque deixastes
o Senhor, também ele vos deixará. Conspiraram contra ele e o apedrejaram,
por mandado do rei, no pátio da Casa do Senhor”.
Lc 11:51-52 “desde
o sangue de Abel até ao de Zacarias, que foi assassinado entre o altar e a casa
de Deus. Sim, eu vos afirmo, contas serão pedidas a esta geração. Ai de
vós, intérpretes da Lei! Porque tomastes a chave da ciência; contudo, vós
mesmos não entrastes e impedistes os que estavam entrando”.
Vontade frustrada?
Por meio da
ilustração de uma galinha que sob suas asas oferece a seus pintinhos proteção,
Jesus lamenta pelo fato de mais de uma vez ter tentado, sem sucesso, proteger
os moradores do juízo. Aparentemente, em todas às vezes, sua determinação
fracassou diante da resistência da oposição deliberada. Embora Jesus lamente
sobre os esforços vãos de salvar seu povo, ele não deixa de concluir a obra da
qual o Pai o incumbiu. Ainda que por enquanto sua obra não tenha o efeito
exterior que poderia e deveria, o plano de Deus concretiza-se apesar de tudo.
Isto nos leva a
conclusão de que, embora sua vontade aqui expressada não seja realizada, no
final de tudo, sua vontade secreta foi plenamente concretizada.
Mais adiante, quando
Cristo chegava à Jerusalém, Ele chora e faz uma declaração de seus decretos
eternos:
Lc 19:41 “Quando ia
chegando, vendo a cidade, chorou e dizia: Ah! Se conheceras por ti mesma,
ainda hoje, o que é devido à paz! Mas isto está agora oculto aos teus olhos”.
Fica claro neste
verso que algo ainda estava oculto à cidade. Existem coisas que pertencem
somente a Deus e que nós não podemos conhecer com nossas mentes limitadas.
Uma vontade. Duas
formas de perceber
A vontade decretiva de
Deus é simplesmente aquilo que chamamos de decreto de Deus. É seu propósito
eterno, pelo qual ele preordena tudo o que acontece. Esta vontade não é
conhecida do homem. Ela existe mesmo antes das coisas criadas. Elas são eternas
e nada pode ser obstáculo para sua realização.
A vontade preceptiva de
Deus são suas avaliações, como particularmente reveladas a nós na sua Palavra
(seus “preceitos”). Essa vontade refere-se à imagem de Deus passada para o
homem. São caracterizadas por aquilo que o homem precisa fazer para viver bem e
alcançar o favor de Deus. São idealizadas nos preceitos de Deus gravados no
coração do homem. Esta vontade é externa e revelada. Jesus, como verdadeiro
homem, mostra isto no seu lamento. Assim como chora na morte de Lázaro, mesmo
sendo Deus e sabendo desde o princípio do dia e hora marcados da morte de seu
amigo, Cristo nos ensina sobre sua vontade revelada. Ele era homem. E como
homem, Ele revela sua tristeza, nos ensinando que, os preceitos de Deus ou sua
vontade revelada, sempre quer o bem do homem e sua salvação. Esta “vontade” é,
por vezes, descumprida pela humanidade. Deus nos deixou suas leis com a vontade
de que nós a cumpríssemos, porém, o homem teima em desobedecer.
A vontade decretiva de
Deus não pode ser resistida com sucesso. O que Deus decretou certamente
acontecerá. É possível, porém, que as criaturas desobedeçam à sua vontade
preceptiva – e elas fazem isso com frequência.
Os preceitos de
Deus, por exemplo, requerem um mundo no qual todos honrem ao verdadeiro Deus,
em que todos honrem seus pais, em que não haja assassino e nem mesmo ira
assassina, etc.
No final das contas,
Cristo não deixou de congregar aqueles que quis. Por isso Agostinho
afirma: “De fato ela não queria deixar que seus filhos fossem
congregados por ele, mas, não obstante sua vontade contrária, ele congregou
seus filhos, aqueles que ele quis” (Enchiridion 24 [97]
[FC 2:450; PL 40.277]).
Devemos viver pela
vontade revelada de Deus
Devemos entender
claramente que, se morrermos em nossos pecados e formos lançados no inferno,
nosso sangue recairá sobre nossa própria cabeça. Não podemos atribuir a culpa a
Deus. A disposição de Cristo para salvar os pecadores é assegurada de maneira
inconfundível nas Escrituras. Se perdermos nossa alma, não poderemos culpar
ninguém, exceto a nós mesmos.
Nossa salvação
depende exclusivamente de Deus: jamais esqueçamos isso. Somente os eleitos
serão salvos: “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o
trouxer” (Jo 6.44). Porém, nossa perdição, se formos condenados,
depende exclusivamente de nós mesmos. Ceifaremos o fruto de nossa própria
escolha; descobriremos, então, ter perdido nossa alma.
Um dia, a soberania
de Deus e a responsabilidade do homem se manifestarão em perfeita harmonia.
Enquanto isso, apesar de nossas dúvidas, jamais questionemos a infinita
prontidão de Cristo para salvar os pecadores.
Conclusão:
A vontade de Cristo
nunca poderá ser frustrada. Seus decretos não falham. Ele não foi pego de
surpresa. Cristo mostra apenas sua vontade revelada ao homem. Como homem ele
teve tudo que qualquer pessoa poderia ter: dor, sofrimento, choro, frustrações,
etc.
Perguntas para serem
respondidas:
1. Jesus
sabia antes da fundação do mundo que isso iria acontecer?
2. Se
Ele sabia e, mesmos assim, criou o mundo, então Ele queria esse resultado?
3. Se
Ele não quisesse esse resultado, Ele poderia ter criado diferente?
4. Será
se Jesus foi pego de surpresa?
5. Ele
lamentou porque sua vontade foi frustrada?
6. Ele
poderia ter feito alguma coisa para mudar? Por que não fez?
7. Como
Cristo poderia querer aquilo que bem sabia jamais aconteceria e cujo contrário
ele já havia decretado?
Referências:
John
M. Frame, A
Doutrina de Deus, trans. Odayr Olivetti e Vagner Barbosa, 1a
edição., Teologia do Senhorio (São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2013).
J. C.
Ryle, Meditações
no Evangelho de Lucas, ed. Tiago J. Santos Filho, 2a
Edição. (São José dos Campos, SP: Editora FIEL, 2018).
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